Oi pessoal! Obrigado pelos feedbacks ao novo bsb!

Nesta semana vou responder a uma pergunta frequente: “como pensar sobre investimentos em um mundo passando por tantas transformações?”. São algumas visões pessoais sobre o tema e sempre em constante evolução.

Se você tem apenas um minuto, aqui é o que você precisa saber:


  • Transformação não é uma exceção, mas a regra do nosso mundo

  • A Power Law explica os eventos melhor que uma distribuição normal

  • A estratégia ideal é investir em empresas resilientes e com alto grau de opcionalidade

  • Empresas de qualidade possuem bons executivos e modelos de negócio que permitem criar muito valor e capturar parte deste de forma continua

  • É preciso investir em inovação constantemente

  • As transformações só podem ser identificadas em conversas com empresas e pessoas imersas nas industrias sendo transformadas


Eu fui abençoado de ter convivido com pessoas e empresas incríveis que ajudaram a moldar minha forma de investir. Em particular, os fundos Generation, AKO, WindAcre e NZS Capital foram grandes influencias sobre a (muito) difícil e prazerosa tarefa de investidor. Vamos lá:

Transformação é a regra

Investidores e Executivos de empresas estão todos no mesmo negócio: alocação de capital, um recurso escasso, para obter os melhores retornos. É uma atividade em que não existe resposta certa, então trabalhamos com probabilidades. Qual a probabilidade do cenário X ou Y acontecer? Fazemos diferentes casos e a decisão reside no resultado da ponderação entre estes.

Em geral, utilizamos uma curva de distribuição normal para cálculo:

Depois de vários anos entendi que esta abordagem é problemática. Os mercados e empresas operam em sistemas altamente complexos. Isso faz com que eventos com baixíssima chance de acontecer recorrentemente ocorram.

Sistemas complexos são incrivelmente sensíveis a pequenas mudanças, dessa forma são melhores explicados por “Power Laws” do que Curvas Normais.

Fonte: NZS Capital

 

O que uma Power Law nos diz sobre o mundo é que eventos extremos são muito mais comuns do que acreditamos: Pandemia, Guerra Rússia-Ucrânia, Eleição do Trump, 11 de setembro, Crise do Subprime, Invasão do Capitólio, de Brasília, 2 Impeachments em <30 anos, dentre outros.

Eventos extremos não são a exceção, mas sim a regra. Portanto, investir baseado num modelo mental de distribuição normal é perigoso. Você vai errar mais do que acertar.

Sistemas complexos não possuem pontos de equilíbrio. Eles passam por grandes transições quando o crescimento para e uma adaptação ou inovação é necessária. Essa adaptação se dá através de um novo tipo de comportamento, que é impossíveis de se prever.

Fonte: NZS Capital

 

Outra coisa que a Power Law nos ensina é que os vencedores ficaram com quase todo o valor econômico criado. “Winner takes all” é uma frase que cansei de escutar fazendo venture capital.

O que fazer num ambiente assim?

Se eventos extremos e transformações são a regra, temos que desenvolver Resiliência (“propriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após terem sido submetidos a uma deformação elástica”) e Adaptabilidade (“capacidade de alguém ou algo de mostrar-se adaptável”). As melhores empresas são aquelas que possuem estas duas qualidades. Isso vem em detrimento de elementos como produtividade, mas não se pode ter tudo.

Por outro lado, também vale a pena buscar oportunidades de investimento que se beneficiam destas grandes mudanças, sendo está uma forma de ganhar dinheiro em meio a um mundo impossível de se prever.

Estamos falando então de um portfólio “Barbell”: numa ponta empresas mais resilientes, na outra ativos mais arriscados, mas cheios de opcionalidade. O ativo excelente possui ambos. Este modelo é inspirado no NZS e em um outro fundo em que trabalhei em Palo Alto.

Barbell

 

O que é uma boa empresa?

Nas duas sub-estratégias o que queremos são empresas de qualidade. A líder de mercado acumula desproporcionalmente o valor econômico de um setor.

Na visão de Warren Buffet, o melhor negócio é um que vende de forma sustentável algo que as pessoas precisam, que não possui substitutos, em que o negócio pode cobrar o que quiser e pode crescer precisando de poucos ou nenhum investimento adicional. Em resumo, um monopólio não-regulado, asset light, vendendo uma necessidade humana.

O problema é que esse negócio não existe (ainda bem!). O corolário disso é que os melhores negócios são aqueles que se aproximam deste em várias dimensões.

“Value investors” pelo mundo todo desenvolveram arquétipos de bons modelos de negócios, onde é possível criar a capturar valor. Por exemplo:

  • Infraestrutura não regulada: tendem a ser um monopólio, o que permite que cobrem o quanto quiserem (caso não sejam regulados). O Google é um exemplo.

  • Barbeadores e lâminas: modelo de negócios em que um item é vendido a um preço baixo para aumentar as vendas de um bem complementar, como suprimentos. A indústria de videogames opera com este modelo.

  • Cobradores de Pedágio: empresas que oferecem um serviço essencial e cobram parte do valor econômico criado. Ex: Visa/Mastercard.

  • Marcas Fortes + restrição competitiva: empresas que tem marcas fortes e também alguma vantagem que impede que a competição entre no mercado, seja capacidade de distribuição ou acesso a suprimentos. Um melhor exemplo no Brasil é a Ambev.

Características de Empresas de Qualidade

Além do modelo, existem características comuns a bons negócios:

  • Sócios e executivos: são pessoas que movem o mundo. Ter gente boa e do bem ao seu lado faz toda a diferença.

  • Foco no longo prazo e cultura de inovação: direcionar esforços e capital para coisas que dificilmente vão mudar e permitem a empresa prosperar. É impossível fazer previsões. Quem poderia prever algo como o Covid? Um excelente exemplo disso é Jeff Bezos da Amazon quando afirma que “Sabemos que em 10 anos nossos clientes vão continuar querendo produtos baratos, melhor seleção e entrega mais rápida. Nos planejamos para continuar entregando isso”. A própria Amazon possui um portfólio Barbell: enquanto a AWS é uma forte geradora de caixa, outros negócios menos provados são financiados por ela.

  • Criam mais valor do que capturam: sempre achei estranho o termo “barreira de entrada”. Dá a entender uma visão combativa do mundo. Atualmente temos que admitir que a maioria das coisas que entendemos como barreiras estão durando cada vez menos. Exemplos:

Ninguém duvidava que o Efeito de Rede das redes sociais Facebook e Instagram era impossível de ser desafiada. Até aparecer o TikTok e mostrar que as pessoas querem mais é consumir conteúdo curto do que se conectar com os amigos. Interessante que isso ocorreu num período em que a Meta estava a anos sendo criticada pelos altos preços dos ads e por piorar a experiência dos influencers e usuários.

Ninguém duvidava que o Google tinha no negócio de busca sua fortaleza. Até aparecer a OpenAI com o ChatGPT e mostrar que fazem 20 anos que o produto de busca do Google é o mesmo e que a tecnologia evoluiu para algo melhor. Interessante que isso ocorreu num período em que a empresa estava a anos sendo criticado pelos altos preços dos ads e por piorar a experiência daqueles que fazem buscas, colocando 5-6 links patrocinados antes de aparecer os resultados orgânicos.

Buscar criar muito valor aos stakeholders, incluindo a própria empresa, é de fato uma vantagem competitiva. Isso só é possível através de continua inovação. Nenhum negócio tem custos de mudança tão alto que um cliente p*** não vai embora. O cliente mais difícil de mudar de empresa é aquele que está muito satisfeito.

  • Crescimento duradouro: investidores ganham mais dinheiro quando a curva de crescimento está acelerando e perdem quando esta desacelera. As melhores empresas são aquelas que conseguem criar novos produtos e entram em novos mercados que fazem com que continuem crescendo. Crescimento duradouro depende de a empresa possuir um bom contexto. Isso quer dizer “Vento a Favor”. Se a sua empresa foi completamente disruptada por uma nova tecnologia (ex: máquina de datilografia), não adianta ter o melhor CEO do mundo, ela vai sofrer.

Como Identificar as Transformações?

Ao mostrar uma primeira versão deste artigo a dois leitores, o feedback foi o mesmo: “existe uma falha em seu modelo. E se for possível prever as transformações? Conseguiríamos desinvestir das empresas que vão perder e investir nas que vão ganhar!”

É praticamente impossível entender uma tendência logo que esta começa analisando apenas os dados. Eles simplesmente não existem! Dados de curto prazo não conseguem justificar transformações fundamentais na sociedade. Um bom exemplo é a penetração de eCommerce:

Fonte: Benedicts Evans

 

Ninguém poderia prever o Covid e a aceleração da penetração do eCommerce, da mesma forma que quase ninguém previu que haveria um retorno a tendencia dos últimos 20 anos, basta ver o quanto as ações de eCommerce se valorizaram em 2020 depois desvalorizaram em 2022.

A única forma que eu conheço de identificar transformações é conversando com empresas. São elas quem tem o insight do que está acontecendo em seus setores. Tem aquele sentimento de “todo mundo fazia X, mas parece que esta indo pra Y agora”. Esse é o melhor tipo de insight que você terá. Triangulando dados conseguimos entender direccionalmente para onde as coisas estão indo, mas não teremos a velocidade. Também temos setores que estão passando por mudanças a décadas e estas continuam. Um ótimo exemplo é o setor de pagamentos.

É aqui que entra a tecnologia. No mundo de hoje, ela é o “Um Anél”, aquele que controla a todos os outros. Sim existem mudanças regulatórias, de gestão, hábitos, mas a maioria das grandes transformações são causadas por avanços tecnológicos.

Papel da Tecnologia no mundo de hoje

 

Isso quer dizer que analisar empresas de tecnologia é uma boa forma de entendermos mudanças de comportamento.

Potenciais Transformações

Existem múltiplas transformações acontecendo na sociedade. Aqui listo algumas delas:

1) Remédios de perda de peso

Eu estou numa batalha para perder uns quilinhos e voltar ao peso pré-Benjamin (meu filho que amo muito). >50% das pessoas que conheço que perderam peso fizeram uso de algum remédio, sendo o Ozempic o mais comum. O mercado para este tipo de medicamento, chamado de GLP-1, cresceu 150x em 10 anos.

Fonte: The Economis e Banco Jefferies

 

A demanda por remédios deste tipo é enorme. Dado seu alto custo, podemos ter um futuro em que os ricos são magros e os pobres obesos. Um mundo distópico. Existem uma série de implicações e transformações na sociedade devido a estes avanços na tecnologia de remédios.

2) Cyber attacks

O custo de cyber attacks, multiplicou por 10 nos últimos 4 anos e projeta-se que multiplique por mais 3 nos próximos 4. A indústria de cyber security é uma das mais saudáveis em termos de crescimento da demanda e empresas continuam investindo consistentemente nesse tipo de atividade.

Fonte: Statista. Obs: o custo aqui é definido como “danos e destruição de dados, dinheiro roubado, perda de produtividade, roubo de propriedade intelectual, roubo de dados pessoais e financeiros, fraude, interrupção pós-ataque do curso normal dos negócios, investigação, restauração e exclusão de dados e sistemas hackeados”

 

3) Adoção de Inteligência Artificial e ChatGPT

Fonte: Contrary Research Center

 

Em 5 dias o ChatGPT atingiu 1 milhão de usuarios, o aplicativo de tecnologia que mais rápido chegou a esta marca. Isso abriu um novo modelo de atuação para a OpenAI, que inicialmente via seu produto como B2B, mas com o forte interesse dos usuários provavelmente tera uma frente B2C.

Concluindo

Transformação não é uma exceção, mas a regra do nosso mundo. Quanto antes abraçarmos essa forma de pensar, mais preparados estaremos. Essa constatação traz um senso de humildade. Nossas projeções infelizmente estarão sempre erradas. Vivemos em sistemas complexos em constante mudança. Para sobreviver e prosperar, as empresas precisam ter resiliência e adaptabilidade. Também vale a pena buscar empresas que possam se beneficiar destas transformações, com alto grau de opcionalidade.

Em ambas estratégias buscamos empresas de qualidade. Isso quer dizer bons sócios e modelos de negócio que permitem criar muito valor e capturar parte deste de forma continua, foco no longo prazo & cultura de inovação.

As transformações só podem ser identificadas em conversas com empresas e pessoas imersas nas industrias sendo transformadas. Focar esforços no desenvolvimento tecnológico e potenciais consequências na sociedade são a melhor forma de entender impactos e empresas que podem se beneficiar destes.

Grande abraço, Edu

DISCLAIMER: essa newsletter não é recomendação de investimentos. Seu propósito é puramente de entretenimento e não constitui aconselhamento financeiro ou solicitação para comprar ou vender qualquer ativo. Faça a sua própria pesquisa. Todas as opiniões e visões são pessoais do próprio autor e não constituem a visão institucional de nenhuma empresa da qual ele seja sócio, colaborador ou investidor.