Oi pessoal, tudo bem? Esta semana o artigo cobre Investimentos e Tecnologia no campo social. Hoje estamos comemorando 10 anos da ONG que co-fundei, o Fundo Patrimonial Amigos da Poli. Infelizmente o trabalho me trouxe hoje ao Vale do Silício e vou perder a festa…

Depois de 12 anos desde a idealização do fundo, este é um bom momento para contar um pouco da sua história, objetivos e homenagear os muitos que fizeram e fazem AdP acontecer. Por fim deixar uma mensagem de otimismo num momento difícil em que estamos passando.


🤗 Twitter: O Amigos da Poli, primeiro e maior fundo Endowment de uma Universidade brasileira comemora 10 anos com números impressionantes!

👍🏻 Nutella:

  • O Amigos da Poli é o primeiro e até hoje maior fundo patrimonial (endowment) de uma Universidade Brasileira. Criado aos moldes dos Endowments das principais faculdades americanas, como Stanford, Harvard e Yale, mas adaptado as realidades brasileiras.
  • O fundo possui números impressionantes. São >R$40M de patrimonio, >190 projetos apoiados, >160 voluntários, >R$5M doados, >20 Endowments criados inspirado no AdP e inspiração de um projeto de Lei aprovado no Congresso brasileiro
  • A idéia do fundo veio a partir de uma doação que um empresário fez para mim e desde então me fez obcecado em mudar a cultura brasileira de doação
  • O Amigos da Poli é o trabalho de um conjunto de voluntários, doadores, professores, alunos e toda a comunidade politécnica!

👊🏻 Raiz: 

A semente

O Amigos da Poli começou a nascer em 2006. Eu estava no terceiro ano da Poli quando meus pais tiveram um problema financeiro. Comecei a trabalhar e procurar formas de ganhar dinheiro. Descobri uma competição nacional de empreendedorismo cujo prêmio eram R$50 mil reais, que poderiam mudar minha realidade. Apliquei, fui passando pelas etapas e quando cheguei a final, era o mais jovem dos finalistas. No dia do evento final, estava confiante da vitória! Eu precisava daquele dinheiro… Na hora do anúncio, um banho de água fria. Não ganhei…

Um pequeno parêntese: sempre amei biografias. Entender a vida das pessoas, como alguém saiu do ponto A para o B e C. É uma forma de desmistificar trajetórias extraordinárias. Quando tinha 13 anos, meu pai me ensinou sobre o Jorge Paulo Lemann. Fiquei obcecado por ele e a história do Garantia, Ambev e a Fundação Estudar. Era algo aspiracional e um norte a seguir.

Voltando ao evento. Perto da saída do teatro vejo Bernardo Hees, CEO da ALL e bolsista da Fundação Estudar. Bom, pensei, não vou sair de mãos abanando, pelo menos vou conhecer ele. Na cara de pau me apresentei e começamos a conversar. Bernardo foi cordial. Mais pro final do evento, minha mãe (sempre ela) me provocou a voltar a falar com ele. Voltei e pedi uma bolsa de estudos. A lógica era que se anos atras ele era um ninguém e pediu dinheiro pro Jorge Paulo Lemann, agora ele estava na frente de um ninguém (eu) e ele era o empresário bem sucedido. Hora de retribuir! Na confiança, o Bernardo me deu uma bolsa e concordamos num cronograma de pagamento para depois que eu me formasse. A primeira coisa que fiz com o dinheiro? Comprei um computador.

Esse evento mudou a minha vida e foi a semente do Amigos da Poli. Foi nesse dia, em que um estranho me ajudou, que entendi que existem pessoas dispostas a ajudar outras, caso vejam potencial. Despertou em mim a vontade de fazer algo grande na área social. Me formei e poucos meses depois comecei a colocar o plano em ação.

Olhar de investidor

Ao analisar o terceiro setor, vi uma oportunidade enorme no tema de Endowments. A “tese de investimentos” era:

  • Benchmark internacional: estrutura de Endowments é dominante nos EUA, que possui o terceiro setor mais desenvolvido do mundo
  • Alumni da Poli: a Escola Politécnica da USP tem um grupo de ex-alunos muito bem sucedido, controladores de empresas de empresas como Itaú, Natura, Cosan, TOTVS, Porto Seguro dentre outras
  • Replicabilidade: caso um Endowment “fique de pé” no Brasil, seria algo pioneiro que poderia ser replicado por outras ONGs no Brasil e especialmente por outras Universidades no Brasil.
  • Impacto na Escola: a Poli possui um talento humano incrível e falta capital para viabilizar projetos de alto impacto.

E assim a ideia foi formada: criar o primeiro fundo de Endowment Universitário do Brasil, em benefício da Escola Politécnica da USP. O nome Amigos da Poli (AdP) era uma forma simpática de dizer que não seriamos parte da Poli, mas seus amigos.  

Colocando o projeto de pé

A primeira coisa que fiz foi montar uma equipe. “Eu” não consigo fazer nada, mas “Nós” podemos muito. Foram co-fundadores do Amigos da Poli o Marcos Matsutani, Diego de Carvalho Martins, Ricardo Milani, Matias Tomazelli, Gabriel Ramires e Máximo Gonzalez. O caso do Máximo foi o mais interessante. Enquanto todos os membros da equipe eram formados em 2008, ele se formou na Poli em 1985 e tinha acabado de aposentar Diretor Estatutário do Itaú-Unibanco quando o convencemos a entrar nessa loucura de criar uma ONG como nunca existiu no Brasil.

Outros membros passaram pelo projeto, alguns saíram por diferenças criativas, outros desanimaram no meio, não vou nomeá-los, mas fica aqui meu agradecimento.

Durante um período de 2 anos a equipe fundadora se encontrava duas vezes por semana, em nossos horários livres, no Starbucks da Rua Amauri para trabalhar. Ficávamos tanto tempo naquele café sem consumir nada, que não me impressiona que este foi a falência, mas enfim, divago um pouco.

Não vou remoer muito o passado. Sim existiram muitas dificuldades, em vários momentos pensamos em desistir. Como noticiado em outros meios, muito do stress veio de membros da própria USP.

Tivemos um forte porto de apoio em nossos pais. Os meus principalmente, vendo o filho no início de carreira, ainda aprendendo o básico, se estabelecendo, dirigindo 3 horas todo dia e ainda assim dedicando 2-3 horas todos os dias a um projeto filantrópico, sempre me apoiaram. Pai, Mãe, muito obrigado!

Riscos

Todo empreendimento e investimento tem riscos e este com certeza tinha vários:

  • Personalização e Prazo: ONG no Brasil tem dono com mandato vitalício. Isso desestimula a doação, pois quem ganha o crédito é o fundador e atrapalha a sucessão. Um Endowment tem horizonte de longo prazo, é preciso pensar além da vida de uma pessoa. Mitigantes: (i) o marketing do Amigos da Poli não se focaria nos fundadores, mas sim nos seus doadores “high profile”; (ii) o estatuto não permitiria a eleição infinita, nem mesmo de seus fundadores, a chamada “Regra Ricardo Teixeira
  • Má gestão / “puxadinho”: ONGs no Brasil tem orçamento administrativo minúsculos e dependem em muitos casos de doações de serviços (ex: contabilidade) para operarem. Mitigantes: o Amigos da Poli teria orçamento para despesas administrativas e contrataria prestadores de serviço de primeira linha. Para referência, na época do lançamento tínhamos o Mattos Filho, PWC e FSB. Além disso, um doador muito importante pro fundo (que sempre quer permanecer anônimo), abriu uma conta conjunta com os voluntários do fundo e bancou a criação do mesmo.
  • Financiamento do Estado: lugar comum entre os brasileiros, a visão é que o Governo, nas suas mais diversas instancias, é mal gastador. Um Endowment para a Poli, no extremo, é doar dinheiro para o Governo. Isso poderia desanimar os doadores. Mitigante: o AdP teria uma estrutura de governança com critérios meritocráticos, que envolvessem diversos stakeholders e prestação de contas na alocação de recursos.

Captação de Recursos

O mérito da nossa captação pode ser resumido em uma expressão: cara de pau. O racional era simples: tínhamos pouco tempo livre, então deveríamos focar em trazer poucos doadores grandes e importantes, que trariam dinheiro em escala e também. Bem, cara de pau nunca me faltou.

Fizemos dezenas de cold calls, abordávamos pessoas de todas as formas possíveis. Em particular, um dia eu enviei um email pro Pedro Moreira Salles, Chairman do Itaú-Unibanco pedindo uma reunião. Eu tinha o email dele pois na época era trainee do Itaú-Unibanco. Ele, que não é politécnico, não quis doar, mas topou nos ajudar a entrar em contato com os primeiros doadores. Contanto que cada nova introdução dele levasse a uma doação, ele as continuaria fazendo. Se uma pessoa dissesse não, a ajuda parava, até o limite de 5 doadores. E foi assim que trouxemos o Jayme Garfinkel (Porto Seguro), Marcelo Medeiros (Banco Garanria/Cambuhy), Láercio Cosentino (TOTVS), Peter Graber (Graber Segurança) e por fim o Roberto Setubal (Itaú).

Em cada reunião pedíamos (1) uma doação, e que esta não fosse anônima pois o nome dos empresários era importante; (2) conselhos para a criação do fundo e (3) trazíamos sempre um nome que sabíamos que a pessoa poderia apresentar, de forma que já tínhamos a próxima reunião com o “VIP” agendada.

Tínhamos uma lista de 25 nomes dos sonhos, conseguimos 23 destes.

O fundo foi lançado em 28 de fevereiro de 2012 (vídeo) e contou com discursos do Prefeito de São Paulo (politécnico), o reitor da USP, o Pedro Wongtschowski, Jayme Garfinkel (imperdível) e do presidente do fundo (este que vos fala). Se o meu vídeo é o que tem mais visualizações, agradeço a meu pai por ter assistido 100 vezes.

O Amigos da Poli captou ~R$5 milhões no seu primeiro ano e começou a doar recursos para projetos educacionais no ano seguinte.     

Sucessão e Continuidade

Garantir a continuidade do Amigos da Poli era fundamental. Em 2014 fizemos nossa primeira sucessão. Eu deixei o cargo de presidente e o Máximo assumiu. Sua gestão foi madura e ajudou a estabelecer os processos e a melhorar o relacionamento com todos os stakeholders. Se eu fui um “War time CEO”, o Máximo foi um excelente “Peace time CEO”. Algo importante pois não podemos viver apenas em guerra.

Em 2016 tivemos uma grande mudança na gestão e o Lucas Sancassani, a quem conhecia de um programa de bolsas para MBAs, assumiu a presidência. Ele trouxe uma equipe incrível, tendo como braço direito o Peter Sonnenberg. Com ajuda de dois doadores em particular, um casal (que também prezam pela descrição)  bem conectados e trabalhadores, o Amigos da Poli multiplicou por 3x. De R$10M para mais de R$30M. Nesse período também houve uma mudança conceitual no fundo. O Amigos da Poli sempre foi tocado por um grupo pequeno de pessoas, no máximo 10. O AdP passou para mais de 150 voluntários, com processos mais bem organizados e ganhou escala. Fica aqui meu agradecimento a esta gestão incrível.

Em 2020 nova sucessão, com a entrada do craque Thiago Ziruolo como presidente do fundo. Para fechar, nomeio aqui várias pessoas que foram diretores e voluntários em diferentes mandatos. Meu eterno agradecimento: Gabriel Borrasca, Mauro Fukunaga, Frederico Wiesel, Andre Simmonds, Juliana Lisboa, Carlos Eduardo Galiano, Marcos Carvalho, Julia Azeredo, Stella Colussi, Vanessa Sales, Célia Kano Pamela Hidani dentre muitos outros. PS: Esqueci alguém? Me avisem por email =)

E sobre os doadores? Bom, são mais de 5.000 doadores e dentre os associados, segue a lista abaixo:

Como medir impacto?

Uma das grandes frustrações daqueles que se doam, tempo e dinheiro, ao terceiro setor é a falta de mensuração de impacto. Confesso que até hoje não encontrei metodologia perfeita. Fundos ESG medem diminuição da pegada de carbono, uma medida facilmente manipulável e superficial. Muitas ONGs medem pessoas impactadas, dado que este várias vezes é subjetivo. Sabendo destas idiossincrasias, farei o meu melhor para apresentar aqueles que considero os principais impactos do Amigos da Poli:

  • >R$40M de patrimonio
  • >190 projetos apoiados
  • >160 voluntários e >5 mil doadores
  • >R$5M doados
  • >20 Endowments criados inspirado no AdP
  •  inspiração de um projeto de Lei aprovado no Congresso brasileiro
  • Vários Private banks brasileiros criaram divisões de Endowments para ajudar familias a pensarem em filantropia de longo prazo
  • Dezenas de alumni do Amigos da Poli foram aprovados nos principais MBAs do mundo, incluindo Stanford, Harvard, Insead, Columbia, Chicago, Kellogg, MIT dentre outras
  • Processo de sucessão bem feito. O Amigos da Poli não prescinde de seus fundadores, mas estes estão à disposição para ajudar quando convocados

E se você esta desanimado com o rumo da politica, de como o Brasil parece que esta ficando pra trás e que o povo desistiu, deixo você com esta imagem. Cada um destes logos tem uma história semelhante a que contei acima. Cada um tem um grupo de pessoas idealistas por trás que correram atras e fizeram acontecer algo que muitos duvidaram. Eu voltei pela Poli, eu voltei pra mais Brasil. E voce, vai voltar para o que?

Grande abraço,

Edu