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🤗 Twitter: Elon Musk pode criar a rede social mais relevante dos próximos anos, mas provável que tenha pago caro…

👍🏻 Nutella: A tese de investimentos do Twitter:

  • Ser sócio de um empreendedor único nos nossos tempos. Uma mistura de Steve Jobs, Henry Ford, Andrew Carnegie, John Rockefeller
  • O Twitter pode ser parte fundamental da infraestrutura da Internet
  • É a plataforma mais amigável a blockchain e anfitriã da comunidade crypto
  • Meta, Snap e TikTok estão cada um com seus problemas
  • Os principais riscos são (i) valuation e (ii) execução do turnaround

👊🏻 Raiz: 

Dez dias atrás Elon Musk completou a compra do Twitter por US$ 44 bilhões, depois de meses de uma disputa jurídica com a gestão da companhia. Os detalhes dessa disputa e toda a teatralidade envolvida, são interessantes, mas não vou cobri-los. O que me interessa é o que será feito com essa plataforma e as implicações para o futuro da Internet. Eu estou otimista com o Twitter, mas cético sobre o potencial retorno financeiro vis a vis o risco. Sendo assim, vou analisar esta compra via a perspectiva de um investidor. Segue aqui a minha tese de investimentos:

1) Ser sócio de um empreendedor único nos nossos tempos. Uma mistura de Steve Jobs, Henry Ford, Andrew Carnegie, John Rockefeller

Quando morei em Nova Iorque, fui Diretor do Capricorn, Family Office do Jeff Skoll, co-fundador do eBay, fazendo investimentos em empresas de tecnologia. Em 2001 o eBay comprou o PayPal, empresa da qual o Elon Musk foi co-fundador e isso criou uma relação entre os dois. Quando ambas Tesla e SpaceX fizeram suas primeiras rodadas de investimentos, o Capricorn participou. Dada a natureza do capital permanente, tive o privilégio de cobrir estas duas empresas no fundo e participar de decisões de investimentos ligadas a elas.

Me sinto bem posicionado para falar sobre a qualidade de Elon Musk como empreendedor. O principal ponto que sempre me impressionou dele é a capacidade de começar por uma missão grandiosa e viabilizá-la em bons modelos de negócio.

PayPal (US$100 bilhões de valor de mercado). Uma das principais empresas de pagamentos do mundo. Seu growth hack virou referência no Vale do Silício e a “PayPal Mafia”, grupo de executivos e fundadores da empresa, criou empresas como Affirm, Linkedin, Youtube, Yelp, Kiva, Founders Fund, Yammer dentre muitas outras.

Tesla (US$715 bilhões). Popularizou o conceito de carros elétricos e é uma das maiores empresas do mundo.

SpaceX (US$125 bilhões). A empresa cuja missão é levar a humanidade a Marte diminuiu drasticamente o custo de enviar cargas ao espaço, começando um processo de democratização do acesso ao espaço. Hoje transporta leva satélites, cargas para a estação espacial e tripulantes.

Outras: SolarCity (energia solar) The Boring Company (transporte em massa), Neuralink (neurotecnologia), OpenAI (inteligência artificial).

Como a pessoa mais rica do mundo e liderando várias empresas, o mundo é de Elon, nós estamos apenas vivendo nele.

2) O Twitter pode ser parte fundamental da infraestrutura da Internet

Musk disse que o motivo da transação é que a empresa é importante para o futuro da civilização, pois tem a função de ser uma “praça pública digital”, onde diferentes assuntos e pontos de vista podem ser discutidos de forma saudável e sem violência.

Com o surgimento da Internet o jornalismo tradicional foi colocado em cheque: parte do valor de informar se perde quando as noticias estão disponiveis 24 horas no nosso celular. A solução encontrada por estes meios foi de se tornar cada vez mais opinativa, deixando o caráter de neutralidade. Isso traz uma vantagem de custo, é mais barato pagar uma pessoa que opina no que acabou de “acontecer” do que uma equipe inteira de jornalistas que investiga os fatos. Também descobriu-se que a opinião radicalizada gera engajamento e receita.

Não foram apenas jornais que perceberam isso. Do lado das redes sociais, os algoritmos chegaram a conclusão semelhante, passando a priorizar posts mais extremos, pois aumentam o engajamento. Mais engajamento, mais audiencia, mais espaço para vender ads, mais receita e lucro.

É aqui que Elon Musk esta vendo a oportunidade.

Diferente do Instagram, que foca em fotos e vídeos, o Twitter foca em textos. As implicações disso são enormes. No Twitter você vai para obter noticias, analises e piadas. O objetivo é ser o lugar onde você vai para se informar. Você não lê as noticias no lá, mas é guiado por ele. O impacto cultural é gigantesco.

A velocidade e densidade de informações é inigualável. Os políticos estão no Twitter, empresários, investidores. Gente com poder e influência. Quando o Lula venceu a eleição, o PM da Inglaterra deu os parabéns pra ele via Twitter e os jornais noticiaram esse fato.

No Instagram você busca marcas e influencers, referências de moda e costumes. Você interage no Instagram com seus amigos dando likes nos stories deles.

O Instagram é aspiracional, não informacional. É feito para distração. Você vai pro Instagram para escapar da realidade. Isso é ÓTIMO para marketing. O Twitter é diferente, intenso, quebra pau e funciona muito bem para algo que esta acontecendo no mundo real, tipo final de campeonato. O que isso quer dizer? Que seu estado mental no Twitter não é o melhor pra você clicar num link e comprar um tênis novo.

A conclusão que aos poucos investidores e especialistas em tecnologia chegam é que o modelo de negócios do Twitter, que copia o do Facebook e Instagram, provavelmente não é o ideal.

Parece obvio? Sim, olhando em retrospecto. A verdade é que tanto o Vale do Silício quanto Wall Street viam muito valor no Twitter, mesmo que durante anos e anos ele nunca conseguisse transformar o valor social em financeiro. No entanto, um dia a promessa precisa virar realidade.

Desde o IPO o Twitter valorizou 8,4% ao ano, abaixo dos 11% do S&P 500 e 15% do índice Nasdaq. A empresa sempre cresceu menos quando comparado com Facebook, Snap e Pinterest.

Mas qual o valor que os investidores veem no Twitter?

O Twitter é  um serviço de microblog e rede social. Do ponto de vista tecnológico, é um host para uma série de microserviços, incluindo (i) serviços aos usuários (que cria a timeline), (ii) gráfico de serviços (que gerencia a rede de contatos de um usuário), (iii) postagem, (iv) perfil, dentre outros. A arquitetura que permite que todos esses serviços operem ao mesmo tempo, em escala, no mundo todo, é bem complexa e funciona muito bem:

O gráfico de serviços é a chave. Enquanto o Instagram entende quem você conhece e quais marcas gosta, o Twitter sabe, melhor que qualquer empresa, exatamente o que seus usuários estão interessados. Ele sabe o que tira um usuário do sério. Além disso, sua base de usuários é muito influente, como mencionei acima.

Qual a oportunidade no fim das contas?

1) Consertar a o produto, em especial o problema dos bots (contas falsas). 2) Em paralelo criar novas funcionalidades. 3) Por fim, testar novos modelos de negócios. Ex: (i) Assinatura por usuário e (ii) Alugar o gráfico de serviços para que novas empresas possam construir a experiência do usuário em cima.

Musk acredita que o Twitter pode voltar a ser mais aberto a desenvolvedores, algo que foi no passado, podendo tomar inspiração no WeChat com seus microapps, alguns desses que valem dezenas de bilhões de dólares por si só, como Meituan e Pinduoduo.

3) É a plataforma mais amigável a blockchain e anfitriã da comunidade crypto, ambos pontos fundamentais para seu sucesso futuro

Na plataforma é possível fazer pagamentos em crypto e também validar NFTs. Diferente de Meta/Google/Apple, que são céticas sobre a tecnologia. No consorcio de investidores que comprou a empresa, está a maior empresa crypto do mundo, a Binance, que investiu US$500 milhões. O que o futuro reserva? Algumas idéias:

a) Combates a bots: para cada post as pessoas teriam que pagar, mesmo que uma quantia baixa. Isso faria com que houvesse um custo financeiro real para os perfis falsos, inviabilizando essa pratica.

b) Todo perfil terá uma carteira crypto: permitindo a contratação de diferentes serviços e compra de produtos. Talvez o Twitter não seja o melhor lugar para comprar uma roupa, mas talvez para contratar um advogado.  

c) Verticalizar o stack de comunicação: competindo com Discord e Telegram. É possível imaginar uma versão premium do Twitter como um equivalente ao Bloomberg tanto para ativos tradicionais quanto digitais.

4) Meta, Snap e TikTok estão cada um com seus problemas

Depois de mudar de Facebook para Meta, a empresa de Mark Zuckerberg anunciou um agressivo investimento com o objetivo de se tornar a empresa líder do “Metaverso”. O Metaverso é, em suas palavras, a próxima evolução de conexão social e a sucessora da internet no smartphone. Uma série de espaços digitais em que as pessoas podem se encontrar, seja com seu smartphone, desktop, mas principalmente utilizando novos produtos de realidade virtual e aumentada.

Quais os problemas?

a) Os tecnólogos não querem a Meta controlando o Metaverso: empreendedores, desenvolvedores, investidores e uma parcela relevante de early adopters de novas tecnologias se opõe diretamente a este plano.

b) O produto (ainda) não é bom: o aplicativo Horizon World tem sido duramente criticado por especialistas em tecnologia, a adoção tem sido baixa até mesmo entre os próprios funcionários da Meta.

c) Essa brincadeira está sendo cara: O Reality Labs, divisão de Metaverso da empresa acumula perdas de US$9.4 bilhões em 2022 e a empresa já avisou que esse número será ainda maior em 2023. Especialistas começam a especular que a Meta provavelmente não tem capacidade de criar o metaverso sozinha. Sua ação caiu 70% no ano

O Snap é uma empresa que todo trimestre apresenta crescimento de usuários, no entanto possui um problema de monetização, em parte causada por mudanças nas políticas de privacidade da Apple. Com uma estrutura de governança inadequada, investidores tem cada mais desengajado da empresa, levando a uma queda de 80% nas ações esse ano.

Por fim, com as relações entre China e Estados Unidos se deteriorando, não é difícil imaginar que o TikTok  eventualmente seja vítima de restrições por parte do governo americano, principalmente à medida que captura mais dados de seus cidadãos. A ideia da rede social da nova geração ser uma empresa chinesa é algo cada vez mais difícil de vislumbrar.

5) Os principais riscos são (i) valuation e (ii) execução

Caso tivesse iniciado a oferta hoje, é provavel que a compra fosse feita a uma fração do valor de US$54/ação. Basta comparar com a performance de Meta, que caiu >70% no ano e Google, que caiu 40%. Os administradores do Twitter foram sabios em negociar um contrato benefico a companhia. Enquanto o mercado caia, o preço de compra do Twitter, com alto premio, estava travado.

Por fim, a execução de um turnaround de produto é muito dificil. Os poucos exemplos são lembrados, como o retorno de Steve Jobs a Apple. Aos que reclamaram das demissões nos primeiros dias do Twitter, lembrem que Steve Jobs nos primeiros meses de seu retorno a Apple demitiu c. 30% da força de trabalho.

Sendo assim, comprar uma empresa por 3-4x mais caro do que ela valeria hoje, num ambiente econômico desafiador e tendo que passar por um turnaround de produto e modelo de negócios, tem muito risco. Eu estou animado para ver o que o Elon Musk fará com o Twitter, mas se o retorno financeiro será bom vis a vis o risco é difícil dizer, não foi uma compra barata…

Grande abraço,

Edu  

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