Oi pessoal, tudo bem? O texto de hoje dura 6 minutos. Sejam bem vindos os 227 novos leitores desde a última terça.

Artigos passados cobrem temas como Ethereum, NFTs, Teoria da Agregação e o bsb.


🤗 Twitter: Blockchain tem utilização no mundo real e não apenas na economia digital.

👍🏻 Nutella:

  • Proof-of-Physical work é uma arquitetura de negócios que utiliza tecnologia blockchain para criar projetos na economia real
  • Blockchain pode ser a tecnologia base para desafiar diversos incumbentes
  • Marketplaces, Logística, Telecomunicações, Academias, Programas de Fidelidade, Serviços Financeiros, Redes Sociais, Franquias, Clubes de Futebol e Associações são alguns dos exemplos de mercados endereçáveis

👊🏻 Raiz: 

O texto de hoje é uma resposta ao pedido de um leitor: “Edu, blockchain ainda parece algo muito distante do mundo real. Dá uns exemplos de como utilizando essa tecnologia é possivel desafiar empresas estabelecidadas. Seria bom também que os exemplos fossem mais locais, brasileiros”. A provocação foi ótima, então vamos lá.

Proof-of-Physical Work

Antes de entrarmos nos exemplos, vale a pena definir o conceito de “Proof-of-Physical Work”.

Uma das características mais poderosas de blockchains é a sua habilidade de criar estruturas de incentivos que permitem qualquer pessoa, sem precisar pedir permissão a alguém, contribuir para um objetivo comum. Ex: qualquer pessoa no mundo, tendo o equipamento necessário,  pode minerar Bitcoin, ajudando no objetivo comum de segurança da rede. Esses incentivos podem servir a projetos de larga escala. Isso melhora muito o processo de formação de capital, algo que precisamos muito no Brasil, um pais que investe pouco e tende a buscar soluções centralizadas coordenadas pelo Estado.

A maioria dos projetos em blockchain se focam em comunidades digitais. No entanto, é possivel utilizar a tecnologia no mudo “real” também.

“Proof of Physical Work” é uma tese criada pelo pessoal do Multicoin Capital e um dos usos potenciais mais interessantes de blockchain. Iniciativas neste tema incentivam que pessoas realizem trabalhos que podem ser verificados para construir infraestrutura no mundo real.

Não estou afirmando que não é possível coordenar pessoas de outra forma que não seja via blockchains. Existem modelos como bônus, recompensas, dentre outras. O que é único de crypto é que existem vários benefícios adicionais:

(i) Escala: ao criar um sistema que não precisa de aprovação e sem restrição, os projetos podem recrutar pessoas mais rápido e pelo mundo todo.

(ii) Neutralidade: o código da blockchain é como uma constituição com diversas clausulas pétreas, sendo uma das mais fortes a neutralidade. Isso quer dizer que a regra não vai mudar no meio do jogo. Ou seja, não tem aquela zerada de bônus no final do ano porque o CEO quer comprar casa na Boa Vista.

(iii) Propriedade coletiva: os usuários e construtores são os donos do meio de produção e alinhados para ganhar dinheiro dessa forma. Note o ganhar dinheiro, ou seja, ninguém é comunista por aqui.

(iv) Finanças Descentralizadas permite a conversão de tokens em qualquer moeda, além de outras soluções e utilidades que não vale entrar em detalhes hoje.

Agora vamos aos exemplos, divididos em três grupos:

1) Economia Real 2) Economia Digital e Serviços Financeiros e 3) DAOs:

1) Economia Real

Mercado Livre

A maior empresa da América Latina é nosso primeira escolha. Seria possível utilizar tokens para direcionar volume de usuários ao marketplace e dar aos vendedores mais incentivo. Os vendedores ganhariam tokens quando atraíssem consumidores para a plataforma para fazer compras. Os vendedores podem então dar parte destes tokens aos consumidores como desconto, ou utiliza-los como comissões da plataforma.

Sobre o MercadoPago, é possivel realizar a maior parte dos serviços utilizando conceitos de finanças descentralizadas. Por exemplo um contrato inteligente pode “segurar” o dinheiro do consumidor e o libera para o vendedor quando ele recebe o produto, da mesma forma que o MELI faz.

Empresas de Logisticas “última milha”:  Loggi, Mercado Livre Logistica, Estoca, etc  

Ao invés de grandes centros de distribuição (CD), poderia existir um protocolo focado em logística. As pessoas que decidissem criar pequenos CDs, por exemplo no quintal da casa delas, para armazenamento e coleta de produtos hiper localizados, receberiam tokens desse protocolo. Da mesma forma os motoboys receberiam esses tokens por levar até a casa das pessoas. A taxa de entrega seria paga em tokens desse protocolo pelos clientes finais.

99 Taxi / Uber

Vamos pensar: faz sentido que quando um motorista paulistano atende um cliente em São Paulo, que 20% do valor desse serviço vá para uma empresa na China ou em San Francisco? Alguns diriam coisas como: “Ah, mas eles criaram o efeito de rede”, “Mas a empresa ajuda se tiver algum problema”.

Sobre a primeira afirmação, sim , mas isso é no nível de cada cidade e sobre a segunda, eu nunca tive muita ajuda do Uber quando tive algum problema. Entendo que no inicio uma marca nova e gestão centralizada foi muito importante para criar esse novo habito, mas agora que já o entendemos, fica mais fácil desafiar o incumbente.

Um sistema que cobrasse pelo menos 15% a menos, num setor com muita elasticidade de preço, tem potencial de vencer. Clientes comprariam o token da rede de transporte e a usariam para pagar pelo serviço. Os motoristas receberiam tokens para que fossem acionistas do serviço que ajudaram a criar, diferente do caso do Uber, em que os primeiros motoristas foram essenciais, mas não acumularam nenhuma riqueza.

Telecomunicações

Através de incentivos via tokens, é possivel criar uma rede wifi que cubra o mundo inteiro utilizando antenas menores que as das grandes empresas de telecomunicações, mas que existem em maior número. Para consumi-la, os usuários compram o token da rede. Os que decidem instalar antenas e cede-las para a rede recebem tokens de remuneração. Existe um projeto hoje chamado Helium que esta implementando isso em larga escala. Infelizmente ele encontrou uma série de desafios, que vamos cobrir em um artigo futuro.

GymPass e Academias

O modelo de cobrança de academias é ineficiente e permitiu o surgimento de empresas em cima que agregam capacidade ociosa e as vendem para empresas repassarem aos seus funcionários, como a GymPass. Já do lado da academia, além de receber menos por usuário, ela fundamentalmente ganha mais dinheiro quando o cliente dela não vai a academia.

Um arranjo utilizando tokens poderia alinhar incentivos: começando cobrando uma mensalidade mais cara, mas a medida que os usuários vão a academia, eles ganham tokens que diminuem a sua mensalidade. Esse aspecto de gamificação com ganhos financeiros poderia atrair planos de saúde e deixaria os empregadores mais satisfeitos em ter seus funcionários indo na academia e ganhando por isso.

iFood

Os restaurantes ganhariam tokens ao direcionar seus consumidores para a plataforma e utiliza-la para o processamento de pagamento. Quanto maior o volume, menos comissão eles pagam. As economias geradas por não pagar a (alta) taxa cobrada para o iFood seriam divididas entre os restaurantes e consumidores.

2) Economia Digital e Serviços Financeiros

XP e Fundos de Investimentos

Criação de um marketplace de fundos de ativos tokenizados. Qualquer pessoa poderá montar seu fundo e oferece-lo a outros investidores. A performance é transparente na blockchain.

Da mesma forma, os Agentes Autônomos podem compartilhar suas decisões de investimento publicamente e os melhores vão crescendo suas carteiras. A infraestrutura das corretoras como XP e outras pode ser replicada na blockchain por um custo muito menor. As economias são distribuídas entre o cliente, gestor e agente autônomo, tirando margem da plataforma central.

Pagamentos Internacionais: EBANX, PayPal, etc

A tecnologia blockchain, por ser global em sua essência, oferece uma solução superior para pagamentos cross-border, como explicado no artigo sobre stablecoins.

Programas de Milhagem e Fidelidade: LATAM Pass, Smiles e o TudoAzul

Com blockchain é possivel que os usuários consigam monetizar seus pontos e os troquem por diferentes ativos. Eles poderiam também investir seus pontos em troca de descontos no futuro. Ex: não use seus pontos por cinco anos e ganhe uma viagem a qualquer lugar do mundo.

Obs: De todos os exemplos, acho esse o mais rápido a aparecer no Brasil.

Redes sociais

Aqui é simples, os usuários ganhariam tokens por postar e comentar na plataforma. O quanto eles ganhariam é baseado na popularidade do conteúdo postado. Os anunciantes pagam para fazer propaganda na plataforma, comprando o token da mesma. O The Rock tem 343 milhões de seguidores no Instagram. Quando ele é pago pela Meta para postar lá? Zero. Tente contratar o The Rock para um evento e te garanto que custa mais que isso…

Mas esse exemplo se aplica ao Brasil? Acredito que sim, pois o modelo de redes sociais especializadas em temas como investimento ou moda é uma tendencia que deve crescer no Brasil.

3) DAOs

Times e Ligas de Futebol

Uma das maiores paixões nacionais, o Futebol brasileiro é mal administrado pelos cartolas fazem décadas. A seleção nacional foi comandada por uma pessoa que se elegia de forma continua na presidência da CBFpor mais de 20 anos.

Agora existe um movimento de privatizar os times, que passarão a ter donos. Isso é um passo na  direção certa de ter mais profissionalização, mas conceitualmente não faz sentido. O Corinthians não tem dono, o “dono” é a sua comunidade, formada em grande parte pela sua torcida.

A figura jurídica brasileira de associação sem fins lucrativos é problemática por ser restritiva  – e eu como fundador de uma me sinto no direito de dizer isso –  é possível fazer algo melhor.

E se ao invés do programa sócio torcedor, os torcedores ganhassem tokens que representassem o equivalente a uma ação dos seus clubes de futebol? Ao colocar um clube dentro de uma DAO – uma Organização Autônoma Descentralizada criada na blockchain, os torcedores teriam direito econômico ao sucesso do time, o que aumentaria o engajamento e traria maior pressão por uma boa gestão. O mercado secundário daria um valor diário ao time e poderia ser utilizado para estruturas de financiamento mais complexas.

Além disso, ingressos e programas de sócio torcedor poderiam ser feitos de forma mais eficiente via NFTs.

Franquias

Uma indústria enorme no Brasil, muitas franquias são excelentes opções de negócios, mas apenas para os franqueadores. Uma franquia organizada numa DAO, em que tokens representem os recursos de todos os membros, permitiria aos acionistas votarem onde colocar uma nova unidade e colecionar lucros sobre o portfolio de franquias da DAO.

Concluindo

Eu acredito que todas essas ideias vão dar certo? Não, mas algumas sim.

Essas ideias estão muito alto nível. Dá para ser mais profundo? Sim, se vocês gostarem de alguma em particular, deixem um comentário que posso escrever sobre ela.

Existem exemplos de projetos sendo desenvolvidos? Sim para alguns casos, em outros ainda estamos a alguns anos de distância.

Voce poderia dar um exemplo sobre um projeto que esta dando certo e outro que não deu certo e porque? Sim. Tema de um próximo artigo.

Esse artigo foi uma chamada para empreendedores desenvolvendo ideias nestes temas virem falar com o bsb? Pode apostar que sim 😉

O volume de recursos investido em empresas de crypto/web3 caiu nos últimos meses, seria esse um bom momento para começar uma empresa? Pergunte ao Bill Gurley.

Grande abraço,

Edu