Oi pessoal, tudo bem? Como prometido, segue a parte 2 (e final) da tese de investimentos em blockchain. Vocês enviaram várias perguntas, vou endereça-las num artigo especifico. Caso você tenha perdido a primeira parte, pode conferi-la aqui.

Obrigado por ler! O crescimento do bsb está fantástico!


Na parte 1 entendemos que blockchain é uma nova plataforma computacional cujo desenvolvimento se encaixa no ciclo tecnológico. São computadores virtuais que podem fazer comprometimentos e garantias, ou seja, não existe um hardware que controla o software, é o software quem controla o hardware. Por fim, são diferentes das empresas centralizadas de internet no sentido em que o serviço é produzido por um grupo de pessoas independentes trabalhando de forma coordenada, cuja remuneração são os tokens.

Tese de Investimentos em Blockhain: Parte Final

Resumo: blockchain tem o potencial de tomar market share dos incumbentes de alguns dos maiores setores da economia. Novos serviços e hábitos podem existir, tendo impacto significante na sociedade. Tendo em vista a complexidade e novidade que esta tecnologia traz, proponho uma forma de dividi-la em cinco grandes áreas: Acesso, Finanças Descentralizadas, NFTs, Web3 e DAOs.

O fato que a blockchain permite garantias, quer dizer que não existe uma pessoa, empresa, governo que pode desligar esse computador. Ele é descentralizado, não tem um ponto de falha. Isso traz confiança. Este é um atributo que nenhuma plataforma tecnológica teve até hoje e explica em parte porque é difícil entende-las. Fazendo uma analogia, quando o smartphone surgiu, era a primeira vez que um computador tinha um GPS. Era possível saber a todo momento onde ele estava. Isso permitiu não apenas o surgimento do Uber, mas que alguém pudesse imaginar que algo como o Uber seria remotamente possível.

O que se torna possível num computador em que podemos confiar? Essa é a pergunta chave. Não devemos pensar nesta tecnologia como simplesmente algo que “ou é mais barata que o que tem ou não vale nada”, mas sim a capacidade de agregar vários serviços em um, cortar intermediários, permitir novos e usos. Em resumo, em ser melhor que “tudo que esta aí”.

Vamos pensar em um exemplo: desintermediação. A figura do intermediário existe para dar confiança. Se o computador pode fazer esse papel via código, então:

  • Não precisamos mais de bancos para realizarmos transações financeiras
  • Não precisamos de advogados, nem de cartórios, para fazer contratos
  • Não precisamos dos marketplaces para vendermos nossos produtos
  • Não precisamos de redes sociais controladas para nos conectarmos

O que isso quer dizer do ponto de vista de investimento é que parte do valor criado pelo mercado financeiro, advogados, cartórios e empresas de tecnologia pode vir a migrar para novos projetos criados nas blockchains. Estamos falando potencialmente de trilhões de dólares. Valor sendo transferido e novo valor sendo criado pela expansão do tamanho de mercados que já são enormes. Essa é a oportunidade.

Aproveito aqui e faço uma ressalva: é importante não pensar em blockchain de forma monolítica. Existem diferentes potenciais usos e aplicações para a tecnologia. Não necessariamente todas vão dar certo e/ou ter o mesmo impacto. Quais vão dar certo? Bom essa é a pergunta de 1 trilhão de dólares, caros leitores.

Parece loucura? Pode ser, mas vou usar um quote do Marc Andreessen de contraponto:

Marc Andreessen, criador do Netscape e um dos grandes pioneiros da internet já viu diversas plataformas computacionais nascerem e crescerem: nuvem, smartphone, realidade virtual e etc. Na visão dele, blockchain é a que mais se parece com a Internet e isso é um sinal que devemos levar em conta vindo de um dos maiores empreendedores e investidores de tecnologia da história.

Vamos detalhar um pouco mais a oportunidade diante de nós:

Toda nova plataforma computacional tem vantagens e desvantagens

Hoje blockchains tem desafios de escalabilidade relevantes. Também é MUITO difícil de usar. Empreendedores do mundo todo estão trabalhando em soluções para estes problemas. É possível construir empresas que tanto alavancam as vantagens, resolvem as desvantagens e idealmente façam ambas.

Bitcoin foi a primeira blockchain

Criada por Satoshi Nakamoto, o Bitcoin nasceu com o proposito de utilizar criptografia ao invés de confiança para que duas partes possam transacionar diretamente sem a necessidade de um intermediário. O objetivo inicial era criar um sistema de pagamentos na internet, resolvendo o “pecado original da internet”. O Bitcoin se utiliza de um método de consenso chamado “Proof-of-work” (vou cobrir esse tema em outro artigo), que registra as transações de uma forma que se torna quase impossível do ponto de vista computacional reverte-las, contanto que mais de 50% da rede atue de forma honesta. Considerando que hoje são dezenas de milhares de validadores de bitcoin, operando no mundo todo e com interesse econômico no sucesso do mesmo, é possível dizer hoje que é uma blockchain resiliente e segura, especialmente depois de 12 anos com pessoas todos os dias tentando hackeá-la.

O Bitcoin é:

  • Descentralizado: as transações estão armazenadas em uma rede de computadores
  • Imutável: as transações não podem ser alteradas depois de feitas
  • Aberto: qualquer pessoa pode ver as transações

E também é:

  • Pré-determinado: só vão existir 21 milhões de Bitcoins
  • Mono-objetivo: a maioria dos detentores querem apenas uma reserva de valor, que é garantida pela pré-determinação

Existem alguns questionamentos sobre o último ponto, mas não vale entrar nestes detalhes agora.

Um empreendedor crypto definiu Bitcoin para mim como uma calculadora. Ele tem poucas funções, mas é muito bom em realiza-las. O fato que não pode fazer muito não é um defeito, mas sim uma característica do protocolo. Se queremos que ele seja uma reserva de valor, a verdade é que é bom que ele não mude muito. No entanto calculadoras são computadores simples.

Bitcoin é a blockchain mais famosa, mas o desenvolvimento e ação acontecem mesmo no…

Ethereum

O Ethereum foi criado em 2013 pelo Vitalik Buterin para deixar qualquer pessoas “escrever contratos inteligente e aplicativos descentralizados (dapps)” (do Whitepaper do Ethereum)

Para entendermos melhor o que essa frase significa, vamos definir algumas coisas:

São nos Dapps que hoje a maior parte do desenvolvimento em blockchains acontece. A maioria deles é construída no Ethereum. Alguns exemplos:

  • No OpenSea é possível comprar e vender ativos digitais.
  • No Uniswap é possível trocar um token por outro
  • Na Decentraland podemos comprar terra num mundo 3D digital

Se Bitcoin é uma calculadora, o Ethereum é um computador. Este projeto buscou a partir da generalização da arquitetura do Bitcoin. Pessoalmente, considero o Ethereum uma oportunidade de investimento fascinante e de alto potencial.

Outras Blockchains

Bitcoin e Ethereum respondem por mais de 50% do valor de mercado, mas existem outros crypto ativos cuja relevância vem crescendo. Não vou cobri-las aqui, mas de forma geral temos sempre um trade-off entre (i) Escalabilidade, (ii) Segurança e (iii) Decentralização. Como diria John Milton no filme Advogado do Diabo: “Tudo não terás”.

Organizando esse Admirável Mundo Novo

Temos o seguinte cenário em nossa frente:

  • Uma nova plataforma computacional que ainda não tem incumbentes consolidados
  • Um movimento de talento migrando de empresas tradicionais para produzir em crypto
  • Crescimento exponencial na adoção, mesmo que com alta volatilidade nos preços dos ativos
  • Capital disponível nos mais diversos estágios
  • Mercados potenciais enormes

O primeiro desafio para um empreendedor ou investidor é como se organizar. Este é um setor em transformação e existem diversas formas de categoriza-lo. Aqui apresento como eu penso sobre esse novo ecossistema do ponto de vista de teses de investimento, que espero sirva como um guia. Cada um desses sub-temas terá um artigo próprio aqui no bsb:

1) Acesso

A maioria das pessoas que interagem com blockchains o fazem puramente por especulação. Existe um desafio em trazer mais pessoas e de faze-la mais útil no dia a dia. Coloco aqui as corretoras e bolsas como Coinbase e Bitso, mas também empresas de infraestrutura, custódia, dados e etc.

2) Finanças Descentralizadas

A indústria de Serviços financeiros é gigantesca e possui receitas combinadas acima na ordem de grandeza de trilhões de dólares. No caso especifico da América Latina, é o maior centro de lucro para as empresas da região. Diversas empresas criam áreas financeiras anexas, que em vários casos acabam se tornando tão valiosas quanto o próprio negocio original, vide MercadoLivre e MercadoPago.

O modelo de negócios de empresas de serviços financeiros consiste na cobrança de taxas, seja no movimento ou investimento de capital e cobrança de juros. Existem hoje dezenas de soluções na blockchain que buscam reinventar esses serviços em código, diminuindo drasticamente os custos.

3) NFT: Non-fungible tokens

Todos gostamos e consumimos arte e cultura. No entanto, desde o início dos tempos o financiamento de artistas é problemático. “Artista passa fome” é o que nossos pais dizem. Dos mecenas em Veneza, passando pelo Napster e agora com Spotify, é difícil que artistas consigam monetizar sua arte. A paixão é maior que a receita dos artistas. Esta é uma das primeiras oportunidades que os NFTs estão endereçando.

Um Non-Fungible- Token é um registro de propriedade na blockchain de um ativo único. Da mesma forma que os tokens fungíveis, seu registro é descentralizado, imutável e aberto.

Existem diversas categorias de NFTs, sendo as principais (i) Imagem para perfil, (ii) Arte & Música, (iii) Gaming, (iv) Utility e (v) Mundos Virtuais. Em 2021, as vendas de NFTs geraram receitas para seus artistas de quase $4 bilhões de dólares, considerando as vendas primárias e royalties de vendas secundárias. Como base de comparação, no mesmo ano o Spotify pagou $7 bilhões de dólares em royalties aos artistas. O que chama atenção no entanto é menos o valor absoluto e mais a média: com 22.400 artistas produzindo NFTs, a renda média destes foi de $174 mil dólares, enquanto o Spotify, com 11 milhões de artistas gerou uma média de $636 dolares por artista. Aos estatísticos de plantão, também não gosto de médias, mas não consegui encontrar medianas destes dados. Eu levo NFT muito a sério e é um espaço que estou estudando a fundo nos últimos meses.

4) Web3

A reimaginação e reinvenção dos serviços que hoje confiamos as empresas de Web2 pode gerar uma das grandes transferências de valor já vistas no mundo dos negócios. Prefiro escrever sobre isso em mais detalhes no artigo de Web3, mas se pegarmos apenas o exemplo dos marketplaces e fizemos uma analogia com a telefonia móvel, podemos começar a entender a magnitude. Antes da Internet, uma ligação para os Estados Unidos custava vários dólares por minuto. A medida que voz começou a ser transmitida pelo IP (pensa no Whatsapp), o custo desse serviço foi a zero. O que pode acontecer com os marketplaces quando a troca de informações e dados também for de graça e organizada via tokens que alinham incentivos? Existem diversos projetos indo atrás dessa oportunidade:

5) DAOs

O que é uma empresa? Se você perguntar a um advogado, uma empresa é um conjunto de contratos sociais. Se estamos discutindo uma tecnologia em que os contratos podem ser inteligentes, implementados por códigos e impossíveis de serem mudados, não seria possível reorganizar diversas empresas, movimentos sociais e ONGs como organizações na blockchain? A resposta é sim e isso se chama DAO -> Decentralized Autonomous Organization.

DAOs no último ano acumularam um patrimônio acima de $10 bilhões de dólares nas suas tesourarias e são uma das áreas mais interessantes de blockchain. Eu mesmo sou investidor de duas e analisando mais duas para investir pessoalmente.

Em termos de timing, sempre uma variável essencial para a vida, eu qualifico estes cinco sub-grupos da seguinte forma:

Existe risco? Sim! Pode ser que blockchain não seja a próxima plataforma computacional? Sim, apesar de eu não acreditar nisso. Existem argumentos o bastante para questionar a tecnologia e todo esse movimento crypto/web3? Sim, na verdade, isso me deu uma idéia para um próximo artigo, a “Antítese de Investimentos em Blockchain”.


É isso por hoje. Tenham uma ótima semana e nos vemos em alguns dias. Obrigado por ler.

DISCLAIMER: essa newsletter não é recomendação de investimentos. Seu propósito é puramente de entretenimento e não constitui aconselhamento financeiro ou solicitação para comprar ou vender qualquer ativo. Faça a sua própria pesquisa. Todas as opiniões e visões são pessoais do próprio autor e não constituem a visão institucional de nenhuma empresa da qual ele seja sócio, colaborador ou investidor.